Olá,
Hoje eu acordei com uma sensação estranha. E eu tinha que te escrever. Quer dizer, eu abri os olhos hoje de manhã, com o sol no meu rosto, já que eu esqueci de fechar a janela mais uma vez, como você previu perfeitamente que eu faria quando foi embora, e uma sensação de sabedoria, maturidade nasceu dentro de mim. Uma sensação única de saber o sentido de tudo que aconteceu. Por isso escrevo. Pra dizer que eu errei.
Bati os olhos nos meus livros e eu sabia, naquele momento depois de acordar, que você nunca tinha realmente prestado atenção ou entendido toda minha paixão por Nelson Rodrigues. Você fazia de conta que ouvia e entendia. Mas, na veradade, não passava perto disso. Continuei olhando e vi o filme que você me deu. Nenhuma identificação. Você não sabe quem é o Tim Burton, o que é Fotografia nem quem é o ator e quem é o dublê. Você não conhece o diretor preferido de uma cinéfila. Tristeza. Segui meus olhos mais um pouco e vi aquela camisa do meu time do coração, que tinha números e você não sabia que era uma edição comemorativa, por conta dos campeonatos vencidos recentemente. Mais tristeza.
Como eu poderia não ter visto isso? Eu e você era uma coisa que não existia, uma afinidade que era farsa, polar e apolar. Não ia dar certo nunca. Nem que eu me tornasse tudo o que você, misteriosamente, esperava que eu me tornasse. E nem que você se tornasse toda a coragem, a força e a compreensão que eu sempre quis. Nem que você, de repente, amanhacesse tão mais maduro, simpático e diplomático do que você é. Nem que todas as sementes que eu fui plantando em você, finalmente, brotassem.
Quando me apontavam você, dizendo o quanto era grande a nossa disparidade, eu não acreditava, de forma alguma. Você era um projeto do qual eu me orgulhava. Você seria lindo quando ficasse pronto. Você prometia. Você ia mostrar a todos eles o quanto podia ser maravilhoso pra mim, o quanto não ia me fazer sofrer, o quanto era sob medida, o quanto a gente só podia dar certo.O erro foi meu. Eu projetei as características da minha alma gêmea, perdida por aí, em você. Projetei coisas que você nunca vai ser, porque você não quer ser. Você não vai me fazer feliz nunca, porque, no fundo, você não quer ser o que me faz feliz. Você não quer ser grande, não quer sonhar alto, não quer planejar, não quer crescer. E eu quero que o meu mundo fique cada dia maior, cada segundo mais cheio de coisas pra eu ver, mais cheio de gente pra eu conhecer, mais cheio de conhecimento pra eu aprender. Quero alguém que veja essas coisas comigo. Quero uma atitude otimista diante da vida, alguém que me diga que as coisas vão melhorar. Alguém que me diga que meu empenho não é à toa, que minha família me protege demais por que me ama demais, que compreenda isso e queira ser parte disso. Quero alguém que entende o porquê eu gosto de futebol e de filmes com frases filosóficas. Quero alguém que entenda a profundidade do meu coração e que se atreva a nadar de verdade, com um mínimo de honestidade, nas suas águas ora calmas e ora turbulentas. Quero alguém que me compreenda em todas as divagações da minha mente lunática e sonhadora. E você, no fundo, nunca quis me compreender. Você queria, no seu íntimo, que eu fosse me acalmando e que toda minha alegria e paixão fossem diminuindo até se tornarem algo mais controlável e seguro. Talvez eu queria algo seguro, mas eu não seja segura. Você também projetava em mim características da tua alma gêmea. Alguém mais tranqüilo, com menos sonhos tão distantes, menos desejos, menos impossibilidade e mais realidade. Você queria realidade, queria de mim mais dependência, carência, mais apego, mais entrega, mais proximidade. E eu queria surrealismo, queria de você mais independência, liberdade, afinidade, equilíbrio. Você queria que eu fosse menos responsável, menos compromissada, menos organizada, mais você. E eu queria que você entendesse o quanto isso fazia parte dos meus cuidadosos planos para um futuro lindo a nossa frente, e não de planos para me afastar de você. Você quer agora, eu quero depois. Entende? Você quer viver o que está acontecendo no presente e eu tenho minha cabeça planejando o futuro, sonhando.
Um dia, cansado, você simplesmente se foi. Hoje eu vejo e sei que não foi por que você sabia do que eu descobri hoje, mas por que você queria mais de mim do que eu poderia te oferecer. Talvez, um dia, um pedacinho maior de mim estivesse disponível. Duvido que iria te contentar e, principalmente, sei que você não estaria disposto a arriscar ou esperar.
Quanto ciúme, quantos autores citados em vão, quanta música banalizada que a gente acaba nem ouvindo mais pra não lembrar. Quanto a gente acha que sabe exatamente o que quer e descobre que não quer. Como a gente erra.
Quero, agora, um pouco de calma, um refúgio, um porto seguro. E você me ofereceu cobrança, carência, pedidos chorosos de atenção, insatisfação, incompreensão e críticas. Quantas críticas, meu rapaz. Que pessimismo, que tristeza, que cara fechada. Sorria. Você é tão bonito, tão jovem. O mundo está aí, só esperando você. É isso que eu desejo pra você. Alegria, vibração, consciência. Era o que eu esperava de você, mas agora só desejo, porque é necessário, pra sua felicidade.
Desculpe o engano e o transtorno, meu rapaz, o erro foi todo meu.
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2 recados:
tá ai uma das coisas que eu aprendi ultimamente, esperar que alguém mude é a receita para o desastre. e não saber a hora de parar e dizer não também.
bjo.
é tão parecido com um texto meu, céci...
que dor, não é. quanto de nós é jogado fora.
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